Obra de condomínio em Guarajuba é denunciada por trabalho infantil e condições degradantes
Obra em Guarajuba é alvo de denúncia por trabalho infantil e condições precárias. MPT investiga. Adolescentes e adultos relatam violações graves.
Adolescente relata jornadas exaustivas e ausência de direitos básicos
Um adolescente de 17 anos denunciou ao Ministério Público do Trabalho da Bahia (MPT-BA) a prática de trabalho infantil e violação de direitos em uma obra no condomínio Guarajuba Garden, em Camaçari, Região Metropolitana de Salvador. Ele trabalhava como ajudante de pedreiro sem registro, sem equipamentos de proteção e em jornadas de até 10 horas diárias, dormindo em um alojamento improvisado com outros colegas
“Saí por causa das condições de trabalho, não tinha como ficar. Não estava aguentando mais”, relatou o jovem ao Portal A TARDE.
A denúncia foi formalizada com apoio da mãe do adolescente e está registrada no MPT como caso de exploração de trabalho infantil.
Promessas não cumpridas e realidade precária na obra
Segundo o jovem, identificado como Fernando*, ele foi contratado com a promessa de receber R$ 94 por dia, uma cesta básica mensal e carteira assinada — o que não se concretizou. Com a filha recém-nascida e sem recursos, aceitou a vaga mesmo ciente da ilegalidade. Ele trabalhou por dois meses, dividindo um “alojamento” improvisado com outros trabalhadores no próprio terreno da obra.
“Não era um lugar apropriado para a gente. Tinha inseto, sapo, e a gente dormia lá porque não dava para ir e voltar todo dia. Gastávamos com comida, transporte… tudo por nossa conta”, disse o jovem.
Mãe relata desespero e dificuldades para ajudar o filho
Dona Maria*, mãe do adolescente, relatou a dor de ver o filho retornar para casa aos sábados com feridas causadas pelo sol forte e exausto do trabalho.
“Comprava remédio para as feridas e ele só descansava no domingo. Na segunda de madrugada, já estava saindo de novo”, contou.
Construção civil está na lista das piores formas de trabalho infantil
O trabalho de menores na construção civil é proibido por lei e classificado como uma das piores formas de trabalho infantil, conforme a Lista TIP, criada pelo Decreto nº 6.481/2008. A atividade envolve riscos físicos, químicos e estruturais incompatíveis com o desenvolvimento de crianças e adolescentes, mesmo em funções aparentemente simples como carregar baldes ou varrer o chão.
Outros trabalhadores relatam condições análogas à escravidão
Outros quatro homens que também trabalharam na mesma obra relataram violações semelhantes. José Paulo*, de 27 anos, com deficiência nas pernas e epilepsia, disse que teve uma crise no local e passou dias sem medicação controlada.
“Dormíamos em tábua, sem colchão. Só levaram colchões depois que saí”, afirmou.
Clóvis*, de 48 anos, disse que acumulava funções na obra e na cozinha. Trabalhava o dia inteiro e ainda preparava refeições para os colegas. Messias*, de 50 anos, ficou sete meses na obra sem carteira assinada, vivendo em alojamento feito de madeirite e úmido, próximo a sacos de cimento. Vinte dias após ser dispensado, foi internado com pneumonia, que atribui às condições do alojamento.
Trabalhadores acionam Justiça do Trabalho
Clóvis* e Messias* ingressaram com ações trabalhistas no Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, com o apoio de advogados que também acompanham o caso do adolescente. O MPT confirmou a abertura de procedimento investigativo sobre o trabalho infantil, com atuação da coordenadora regional de combate ao trabalho escravo, Maria Manoela.
Associação nega responsabilidade e alega armação
Rouze Meiry Pereira Lima, presidente da Associação Civil dos Moradores do Condomínio Guarajuba Garden, negou envolvimento direto nas contratações e afirmou que a responsabilidade é da empresa contratada, a Pithon Raynal Consultoria.
“Eles forjaram um alojamento fantasma, colocaram camas para dizer que dormiam no lugar. Isso aí é problema da empresa que administra, a Pithon Raynal”, declarou.
Empresa se cala; MPT confirma processo
Procurado pelo Portal A TARDE, o engenheiro Henrique Pithon Raynal, sócio da empresa, disse que “não tem o que falar”. O MPT confirmou que acompanha judicialmente o caso do adolescente, mas ainda não há denúncia formal sobre trabalho análogo à escravidão. Há, no entanto, processo judicial em curso na 4ª Vara do Trabalho de Camaçari, movido por trabalhadores.
