Arsenal dos bandidos ficou mais forte e mais novo após decretos pró-armas de Bolsonaro, diz estudo
A flexibilização promovida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no acesso a armas de fogo provocou uma mudança profunda no perfil do armamento apreendido pelas polícias no Sudeste e contribuiu para modernizar o arsenal utilizado pelo crime organizado. A conclusão é do estudo “Arsenal do Crime: Análise do perfil das armas de fogo apreendidas no Sudeste”, do Instituto Sou da Paz.
A pesquisa analisou 255,9 mil apreensões realizadas pelas polícias estaduais e pela Polícia Federal entre 2018 e 2023, a partir de dados fornecidos pela Lei de Acesso à Informação (LAI).
Crescimento das pistolas 9 mm após decreto de 2019
Um dos pontos mais impactantes é o salto no uso de pistolas 9 mm — cuja compra foi facilitada por decreto editado em maio de 2019.
Em 2018, 28,5% das pistolas apreendidas eram 9 mm.
Em 2023, esse número saltou para 50,5%.
Antes da mudança, o calibre era restrito às forças de segurança. O presidente Lula (PT) revogou as normas ao assumir o governo e classificou os decretos de Bolsonaro como “criminosos”.
Armas mais novas e migração rápida do mercado legal para o crime
O estudo revela que as armas apreendidas estão cada vez mais novas:
170 armas fabricadas até dois anos antes da apreensão foram encontradas em 2018.
843 armas nessas condições foram apreendidas em 2023, apenas em São Paulo.
Para o Instituto Sou da Paz, o número indica forte migração de armas recém-adquiridas legalmente para o mercado clandestino.
Revólveres em queda; pistolas e armas de maior potência em alta
Entre 2018 e 2023:
Apreensões de revólveres caíram de 42,2% para 37,6%.
Apreensões de pistolas subiram de 25,1% para 35,9%.
O padrão se repete em São Paulo. No período:
A participação das pistolas cresceu de 25,6% para 33,4%.
E revólveres caíram de 47,4% para 43,5%.
Apreensões de pistolas 9 mm no estado saltaram de 273 (2018) para 1.305 (2023).
Mais fuzis em circulação
O Sudeste registrou 4.444 apreensões de fuzis entre 2018 e 2023.
Em São Paulo, foram 910 casos — aumentaram de 0,9% do total de apreensões para 1,5%.
Armas artesanais caíram, mas continuam representando parte significativa do poder de fogo do crime, especialmente após a descoberta de fábricas clandestinas vinculadas a facções.
Explosão no número de munições para CACs
Um dos decretos de Bolsonaro permitiu que CACs (caçadores, atiradores e colecionadores) comprassem:
até 5.000 munições por ano para armas de uso permitido
e 1.000 unidades para armamento de uso restrito, incluindo fuzis.
O texto também já foi revogado.
Para Bruno Langeani, consultor sênior do Sou da Paz, as quantidades eram “absurdas” e incentivaram esquemas com “laranjas”.
O TCU já havia apontado:
2.579 mortos com registro ativo de CAC
9.387 pessoas com mandado de prisão também registradas como CACs
19.479 com processos de execução penal em andamento
Onde as armas são apreendidas
O levantamento mostra que armas ilegais estão mais presentes dentro das residências:
31,8% das apreensões em São Paulo ocorreram em ambiente doméstico.
As apreensões em vias públicas continuam sendo maioria, mas a malha rodoviária também aparece como eixo importante, indicando trânsito para o Rio de Janeiro e para estados do Nordeste.
Principais cidades com mais apreensões
Em números absolutos, São Paulo lidera o ranking, com 14.842 armas apreendidas entre 2018 e 2023.
Já no índice proporcional, Guaratinguetá ocupa o primeiro lugar com 312,2 apreensões por 100 mil habitantes.
O estudo aponta ainda que 72% das apreensões no estado são realizadas pela Polícia Militar, contra apenas 14,9% pela Polícia Civil, refletindo “fragilidades na política de segurança”, segundo os pesquisadores.
Bolsonaro dizia defender liberdade e autodefesa
Ao editar os decretos flexibilizando o acesso às armas, Bolsonaro afirmou que estava devolvendo ao cidadão o direito de se defender. Em diferentes momentos, também argumentou que o armamento civil evitaria um eventual golpe de Estado e protegeria a democracia.
Hoje, o ex-presidente cumpre pena de 27 anos e 3 meses, condenado por tentativa de golpe.
